Uma reflexão sobre o sangue e os alimentos pode abranger duas perspectivas diferentes.
Puro e impuro
A primeira reflexão pode estar ligada ao conjunto de alimentos permitidos e proibidos pela lei de Moisés no Sinai, da qual encontramos uma lista em Levíticos 11. Nessa lista está, por exemplo o porco, que os judeus até hoje não comem. Esses animais são tidos como impuros e não devem estar nas mesas dos judeus.
Em relação a este ponto, acredito que toda reflexão deva ter presente o texto de Marcos 7,18-19:
E ele (Jesus) disse-lhes: “Então, nem vós tendes inteligência? Não entendeis que tudo o que vem de fora, entrando no homem, não pode torná-lo impuro, porque nada disso entra no coração, mas no ventre, e sai para a fossa?”
Jesus, que era judeu, seguia as tradições alimentares do judaísmo. Elas podem ter várias explicações: desgosto por certos tipos de animais, educação alimentar, questão higiênica-sanitária, evitar identificação com certos comportamentos de animais. No fundo, a lei mosaica traz um ensinamento positivo: diante da comida, que um bem dado por Deus, precisa considerar o que se está comendo, considerando a refeição dentro de um âmbito sagrado.
Apesar desse valor positivo da tradição judaica, Jesus introduziu um outro tipo de relação com essas prescrições. Querendo tirar fora toda a força do significado de santificação para o homem que está à base da observância das leis alimentares, ele relativiza a observância exterior, valorizando antes de tudo a atitude do coração e antepondo esta àquela (Mt 15,11-20).
Sacralidade da vida
A Bíblia não exclue a possibilidade de comer carne, mas diz que quando um animal é usado para tal fim, precisa tirar dele todo o sangue. Esse preceito deriva do valor que a Bíblia dá ao sangue, que é o partodor de vida, que pertence unicamente a Deus e dela nenhum ser humano pode dispor.
Hoje esses costumes continuam tendo seu valor para os judeus, que se preocupam em comer alimentos sadios, alimentos cosher. Eles têm leis inerentes à comida (cashrut) que são severamente respeitadas, como, por exemplo, a impossibilidade de comer, juntos, carne e laticínios.
Certas práticas são ligadas a aspectos culturais e, no decorrer dos séculos, podem perfeitamente mudar. Todavia, é um pecado perder o significado que elas transmitiam. Esse sim não deve nunca ser esquecido. Às vezes a vida, em todas as suas expressões, no mundo de hoje, não é vista mais como um bem, um dom que não nos pertence, mas que vem de Deus. Esse é um valor que teríamos que conservar e recordá-lo.