A leitura da ação de Deus em nossas vidas tem muito a ver com a concepção de religião de cada um. A concepção segundo a qual existe um Deus que castiga está intimamente ligada à ideia da religião como uma troca, onde o “servo” oferece algo ao “senhor deus” e, em câmbio, é agraciado pela divindade. O povo de Israel, muitas vezes, tinha essa concepção de Deus, que dura ainda em muita religiosidade popular e também em algumas comunidades que se identificam com a teologia da retribuição. Mesmo na história da igreja essa concepção da fé foi protagonista. Basta lembrar, por exemplo, do final da Idade Média, do tempo da Reforma, quando com um pouco de dinheiro se comprava um pedaço de céu, dizendo de maneira sintética.
É possível ler essa concepção também na Bíblia, em diversas passagens. Elementos trágicos do povo hebreu, muitas vezes são lidos nessa perspectiva. Lembremos, por exemplo, como muitas vezes a deportação dos hebreus para a Babilônica é visto como um castigo divino por causa da infidelidade do povo.
Deus, na verdade, não é temperamental e não precisa da nossa bajulação; somos nós que precisamos dEle! O que Ele nos dá é completamente gratuito e não exige nada em troca. Ele tão pouco distingue a quem dar a sua graça: “ele faz nascer o seu sol igualmente sobre maus e bons e cair a chuva sobre justos e injustos” (Mateus 5,45).
Por que o mal?
Sei que muitos poderiam se perguntar de onde vêm as coisas negativas que acontecem em nossa vida e se no meio das desgraças Deus não está presente. É necessário sublinhar que o mal e a desgraça são ausência de Deus. Não se trata de Deus que se afasta, mas nós que nos afastamos. Esse “nós” nem sempre é uma culpa individual, pois vivemos em comunidade e sofremos também a consequência da escolha dos outros.
O mal é consequência da escolha humana, do percurso da humanidade. Deus tem “culpa” só se considerarmos que ele nos fez e colocou como condição para a nossa felicidade o estar próximos dEle: “fizeste-nos, Senhor, para ti, e o nosso coração anda inquieto enquanto não descansar em ti” (Agostinho).
Por que alguns são punidos e outros não?
Essa é a sensação que temos. Há personagens bíblicos, como a menção que você faz sobre Jacó, que fizeram o mal e são tidos como figuras exemplares. Há outros que por tão pouco são condenados à desgraça. E é assim também na realidade em que vivemos. Quem não conhece pessoas tão santas, mas que viveram situações desgraçadas, quem ninguém almeja para um cristão.
Em relação às histórias bíblicas, somos influenciados pelo autor que quer transmitir como Deus se revela na história e condiciona o nosso juízo sobre certas pessoas. É assim, por exemplo, que o rei Saul é rebaixado e Davi colocado em cima de um pedestal, como uma figura ideal.
O juízo divino é, por outro lado, um tema fundamental da teologia bíblica; seremos julgados em base à resposta que damos com nossa vida. Mas a condenação não é uma vontade divina. De fato, Deus nos criou para que fôssemos salvos e fez de tudo, inclusive enviando o seu filho, para que alcançássemos essa meta. Depende de nós e da comunidade em que vivemos.