Lucas em Atos 17 conta que Paulo, no Areópago de Atenas, fez um discurso aos gregos (versículos 12-34). Nessa sua fala, encontramos a frase que você menciona:
"O Deus que fez o mundo e tudo que nele há, sendo Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos por mãos de homens"
Paulo, em Atenas, se impressiona com "a cidade tão entregue à idolatria". Nesse contexto ensina na sinagoga e na praça. A cidade era famosa por se interessar por questões filosóficas. Paulo aproveita dessa 'sede' dos habitantes da cidade ("Poderemos nós saber que nova doutrina é essa de que falas? Atos 17:19"), ensina a doutrina sobre o Deus de Jesus Cristo. A frase acima é um desses ensinamentos.
Esse encontro com os filósofos de Atenas, podemos dizer que seja um das primeiras tentativas de diálogo do cristianismo com a cultura de uma determinada sociedade, do missionário com o ser humano "pré-cristão". No final das contas, parece que Paulo não foi muito eficaz; quando começa a falar sobre ressurreição, todos vão embora. E provavelmente o comentário de 1Coríntios 2,1-4 se refere a essa experiência negativa.
Embora essa seja uma leitura possível, é mais provável ler esse texto como uma denúncia de Paulo em relação à forte ignorância religiosa dos atenenses, denunciando a incapacidade do ser humano, com sua busca filosófica, de alcançar o essencial. Apesar disso, é capaz de assumir um discurso que não ignora completamente o caminhar da plateia, nesse caso, filósofos e poetas pagãos, descobrinho aspectos positivos mesmo na religiosidade que em si é caracterizada pela idolatria ("Senhores de Atenas, em tudo eu vejo que vocês são extremamente religiosos" (Atos 17,22.).
Por exemplo, a afirmação da onipresença de Deus ("ele não habita em santuários feitos por mãos humanas" - versículo 24) é um pensamento comum também entre os filósofos, que polemizavam com a tendência popular de "fechar" Deus dentro dos santuários. Da mesma maneira, os filósofos concordavam com Paulo no fato que Deus não precisa de nossos dons, como se tivesse necessidade de alguma coisa ("não é servido por mãos humanas, como se precisasse de alguma coisa" - versículo 25).
A onipresença divina
Tratar do tema da onipresença divina, não é exatamente a maneira ideal de ler esse texto de Atos dos Apóstolos. Apesar disso, é possível tirar alguns elementos úteis para a reflexão teológica.
No catecismo aprendemos que Deus é todo bem, sem algum mal, é presente em todo lugar, pode fazer o que deseja, conhecendo tudo e todos, temas que podemos resumir com as palavras “onipresente”, “onipotente” e “onisciente”.
Todavia, esses termos muitas vezes são entendidos de maneira mágica, como se Deus fosse um tipo de inspetor, que controla tudo. O elemento básico é a presença salvífica, capaz de abraçar tudo e todos; o Senhor está em todos os lugares e conhece a todos por causa da sua comunhão com sua criatura e com o mundo criado e supera o conceito de presença e intelecto.
Para questionar o conceito tradicional que temos dessas três características, pensemos na tradição que muitas vezes via Deus como uma realidade “escondida” (dios absconditus).
Em relação à onipresença divina, deveríamos lê-la não como presença física em todos os lugares, em todos os templos, capelas e igrejas. Essa é uma realidade testemunhada pelo próprio Cristo: “onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou aí no meio deles” (Mateus 18,20). A onipresença tem a ver mais com a ilusão humana que quer se afastar de sua presença. Ao invés, Deus está na nossa vida, sempre e em todo lugar que estejamos, também na escuridão; tudo o que vivemos e somos é penetrado pelo olhar divino. A mão divina está sempre pronta a tomar a nossa e nos conduzir pela estrada correta, esperando o nosso sim.
Portanto, essas características divinas significam uma proximidade e não um juízo que traz terror, ao invés, apoio e libertação.