Assim lemos em Lucas 10,1:

O Senhor escolheu outros setenta e dois discípulos, e os enviou dois a dois, na sua frente, para toda cidade e lugar aonde ele próprio devia ir.

O texto segue e vai, depois, até o versículo 20, quando os 72 discípulos voltam alegres da missão

Não sabemos quem são esses discípulos, apesar da existência dessa lista que a tradição nos passou (não é um elenco bíblico!) Na Bíblia nda é dito deles. Poderíamos fazer hipóteses. É provável que se trata de uma menção que Lucas faz a todos os que anunciam a Boa Nova, referindo-se também a nós hoje.

Há, sem dúvidas, também uma referência ao Antigo Testamento. Lembramos, por exemplo, dos 70 anciãos, chamados por Moisés para estar na Tenda, sobre os quais descem o Espírito de Deus, além dos dois jovens que, contemporaneamente, profetizam no acampamento (70 + 2) – Veja Números 10.

É ainda mais evidente a referência a assim conhecida Tábua das nações, apresentada em Gênesis 10. Ali se mostra que os descendentes dos filhos de Noé (sem, Cam e Jafé) são 70. Há alguns manuscritos do texto de Lucas que, para conformar o número dos discípulos com o número das nações apresentadas em Gênesis 10, invés de 72 diz que eles os enviados por Cristo foram 70.

 

Contexto literário e histórico

Pouco antes da nossa passagem, em 9,51, começa a segunda parte do Evangelho de Lucas, que descreve a atividade apostólica de Jesus enquanto realiza a sua viagem até Jerusalém (termina em 19,29).

A primeira etapa se passou na Galileia, aberta com a apresentação do programa de Cristo na sinagoga de Nazaré (Lucas 4).

Na segunda etapa, entra na Samaria, enviando mensageiros diante de si (9,52) e recebendo novos discípulos (9,57-62).

 

A missão dos 72

Há muitos elementos no texto de Lucas que nos sugerem possíveis reflexões.

  • Primeiro de tudo, eles são enviados por Jesus para onde ele próprio devia ir. Isso mostra que o discípulo é o porta-voz de Cristo; não é o padrão da Boa Nova.
  • São enviados dois a dois: isso facilita a mútua ajuda e isso faz com que a missão não seja individual, mas comunitária. Duas pessoas representam melhor a comunidade.
  • A primeira tarefa e “pedir” para que o Senhor envie operários para a colheita. Isso faz com que os discípulos se sintam responsáveis da missão, pedindo ao Pai pela continuidade dela.
  • Os discípulos são enviados como cordeiros no meio de lobos. A missão é uma tarefa difícil e até perigoso, sobretudo por que o sistema que impera é contrário à comunidade, contrário ao amor.
  • Não levam nada consigo, exceto a paz. Isso significa que precisam confiar na hospitalidade das pessoas, demonstrando confiança em quem os acolhe e sublinham a convivência comunitária do povo de Deus.
  • Não devem ir de casa em casa, mas ficar na mesma casa. É um apelo para a convivência estável, participando da vida e do trabalho do povo do lugar em que estão, vivendo daquilo que recebam em troca. Existe, portanto, confiança na partilha.
  • Comam aquilo que lhes é oferecido, sem se preocupar, como podia acontecer com alguns grupos religiosos, se um alimento era ou não puro. Os discípulos não deviam se separar do povo.
  • Precisam lidar com quem é doente (lepra) e expulsar os demônios. Isso mostra que eles têm que acolher, desde dentro da comunidade, aqueles que foram excluídos.
  • Por fim, os discípulos podem anunciar a presença do Reino de Deus