É uma frase que aparece no Salmo 62,12. Acredito que o sentido imediato é que a Palavra de Deus é única e que a minha atenção deve ser toda dedicada a ela; o que ele diz, é para sempre. Do nosso ponto de vista, ao invés, devemos tornar sempre a ela, escutá-la sempre, como se fosse nova.

Esse sentido é reforçado pelo paralelo que encontramos no livro de Jó 40,5:

Falei uma vez, não repetirei; duas vezes, nada mais acrescentarei.

 

A recepção do texto

Pode ser que esse texto nos proponha também uma visão mais ampla da Palavra de Deus, que está ligada ao leitor, que recebe o texto: Deus fala uma vez e várias vezes ele é escutado!

Do ponto de vista da dinâmica da transmissão de um texto literário, além do sentido que o autor quis dar a um texto escrito, ele contém também outros significados que os leitores darão a ele, segundo a própria sensibilidade e a própria história, tanto pessoal quanto coletiva. Essa mesma dinâmica funciona também para a Bíblia, que é igualmente uma obra literária: a Palavra de Deus no foi dada e não é estática, mas dinâmica. 

Cada pessoa interpreta a Bíblia de maneira única. Cada vez que um texto é lido, pode ganhar um sentido novo. É por isso que basta ao Senhor falar uma única vez. Nós, seus fieis, daremos sentido sempre novo.

No fundo, Deus fala e nos "apoderamos" de sua palavra. Por exemplo, Paulo que escreve aos Coríntios fez com que milhões de pessoas torcessem para um time chamdo "Corinthians" (mesmo com a influência do time inglês, com esse nome que esteve no Brasil em 1910).

Igualmente, o que dizer da influência da Bíblia nas obras de Tolkien (Hobbit, Senhor dos Aneis). Ele até participou da edição da Bíblia de Jerusalém, sendo um crítico literário. Suas obras são quase catequeses em forma de romances. As visões que neles encontramos derivam da visão bíblica do homem e de Deus, especialmente dos textos de Paulo aos habitantes de Coríntio, onde sublinha:

O que é fraqueza no mundo, Deus o escolheu para confundir o que é forte.

No fundo essa é a mensagem que Tolkien passa: a força do fraco, encarnada por Gandalf, que se inspira em Cristo: "o que é loucura para o mundo, Deus escolheu para confundir os sábios" (1Coríntios 1,27).