A sua pergunta tem como contexto, pode ser sem que você se dê conta, a questão levantada pelo famoso dito "sola fides" (somente por fé), um dos pontos que caracteriza a doutrina protestante. Aqueles que refletem sobre essa afirmação, muitas vezes, relembram a carta de Tiago, onde em 2,14 lemos:
“Meus irmãos, qual é o proveito, se alguém disser que tem fé, mas não tiver obras? Pode, acaso, semelhante fé salvá-lo?”
E mais adiante, no final do capítulo, o autor da Carta conclui:
Tal como o corpo está morto se não há espírito nele, assim também a fé sem obras está morta.
Não sei exatamente o que você entende por "a fé pode matar". Talvez tem a ver com a questão dos fundamentalistas que se suicidam em nome de Deus. Ou será que você estava pensando nos mártires cristãos: uma dedicação incondicional aos ensinamentos divinos que pode levar à morte, como aconteceu e acontece com os mártires que levam sua adesão a Cristo até às últimas consequências?
Nesses dois casos, obviamente precisamos destinguir o tipo de fé. Aquela dos fundamentalistas poderá ser uma fé em si mesmo, na capacidade de se dedicar à uma causa, mas é provável que não está relacionada com a causa divina. Ao invés, em relação aos mártires, definição dada pela comunidade posteriormente, aparece evidente o empenho incondicional ao chamado divino e não à própria vontade. É óbvio que há uma diferença: o primeiro escolhe morrer, enquanto o segundo escolhe simplesmente seguir a Cristo e a morte não é uma decisão sua, mas consequência de decisão de outras pessoas, que se tornam assassinas.
Portanto, a fé pode levar à morte, mas não por escolha própria, ao invés por determinação altrui. Jesus não escolheu morrer, mas foi assassinado. Quem tem fé não busca a morte, mas a vida!
As obras e a fé
No início do texto mencionamos a Carta de Tiago, que provavelmente está à base de sua pergunta. No fundo a morte pela fé não tem muito a ver com esse texto, mas acho conveniente dizer uma palavra sobre o tema, que normalmente é colocado em contraste com a teologia protestante.
A "sola fides" pode ser vista sublinhando a iniciativa divina da nossa salvação. A obra redentora de Cristo é colocada em primeiro lugar: a nossa salvação deriva completamente da graça de Deus, sem que a mereçamos.
Essa perspectiva foi esquecida por certa teologia durante um tempo e fazemos bem recordá-la. Por outro lado, a Carta de Tiago chama a atenção para o perigo de cair em outro extremo. Alguns, de fato, poderiam dizer: "tendo Deus nos salvado, não precisamos fazer mais nada, pois já estamos garantidos no céu".
A questão de Tiago não é se a fé salva ou não salva. Ele afirma que uma fé sem obras não pode salvar. Se eu tenho fé em Deus, as obras são consequências essenciais e testemunham essa fé que é graça de Deus.