Na Bíblia, na maioria das vezes, esses dois termos se referem à mesma coisa. Torah é uma palavra hebraica que em grego foi traduzida como nomos, cujo significado é "lei". Na verdade a palavra hebraica não é exatamente "lei". A palavra hebraica tem como significado "atirar" (uma flecha com o arco), "chover", "indicar", "dirigir", "ensinar". Embora pareçam significados diferentes, todos eles têm em comum a ideia de um movimento que se realiza em linha reta e que vai direto ao alvo (a flecha, a chuva, o dedo que indica), que se poderia atribuir também ao ensinamento bom, que precisa ser direto e exato.
Em síntese, Torah é ensinamento e, em sentito estreito, designa o Pentateuco, isto é, os primeiros cinco livros da Bíblia: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Em sentito mais largo indica todo o Antigo Testamento e não só: também a tradição rabínica, os ensinamentos dos mestres judeus que se desenvolveram desde o II século antes de Cristo até por volta do ano 700 depois de Cristo. Este ensinamento é dito "Torah oral", isto é, o conjunto das especulações normativas, éticas, históricas e filosóficas dos mestres daqueles séculos. Primeiro foram transmitidas de maneira oral e depois foram colocadas por escrito em textos: Mishnah, Talmud, traduções aramaicas da bíblia e outros.
O fato que a palavra "Torah" não significa exatamente "Lei" não quer dizer que o aspecto normativo não seja presente. Apenas criou o ser humano, Deus impôs a ele obrigações e proibições e também as tábuas dadas a Moisés sobre o Monte Sinai são manifestações da importância da Lei e do seguimento da justiça na sociedade humana.
A Lei: um limite ao caos
Existem vários termos na Bíblia que recordam a lei; um em particular nos ajuda a entender o que é: CHOQ. "Choq" é um palanque de madeira, que é usado para marcar as fronteiras, as divisões de propriedades. A fronteira marca um limite, mas também é o que permite que tudo exista em sua diversidade e individualidade. Um exemplo desse conceito vem do Livro de Gênesis: Deus cria através de sua Palavra, e com esta Palavra, por um lado, cria suas criaturas, cada uma diferente e particular ("de acordo com sua espécie"), por outro lado impõe a cada um o seu próprio limite. Deus faz o mundo através das separações: separa a luz da escuridão; as águas do seco; as águas superiores (chuvas) das que estão embaixo (mares e rios). Se todas essas coisas, boas em si mesmas, não tivessem limites, uma fronteira, teríamos o caos, a confusão, a anti-criação. Tudo o que foi criado veria anulada a sua dignidade individual e inclusive a possibilidade da sua existência. Na história do Dilúvio (Gen 7) encontramos explicado esse conceito: através da confusão das águas, que excedem seus limites e invadem a terra seca, Deus anula a primeira criação e tudo morre. No mundo humano e terrestre, o direito e suas leis são a expressão do limite que permite viver juntos.
Vista assim, a lei é a descoberta da existência de outros diferentes de nós, Deus e os irmãos, e nos ensina a relacioná-los de acordo com sua peculiaridade. O paradoxo da lei é que se trata de uma limitação que nos faz experimentar uma liberdade absoluta, porque somente quando descobrimos que os outros existem, finalmente começamos a sair de nós mesmos e a nos libertar.
A Torah e o Novo Testamento
Existem muitos preconceitos entre os cristãos. Creio que muitos diriam: "Agora temos Jesus; nele está a plenitude da revelação divina. A que servem os mandamentos e os outros preceitos transmitidos pela tradição?"
O evangelista Mateus, um judeu que escreve acima de tudo para os fiéis do judaísmo, nos diz que o próprio Jesus procura esclarecer este ponto. Jesus é apresentado como o novo Moisés que, no "Monte", renova a lei. Não se trata de uma lei diferente, mas de seu "mais", do sentido de justiça que Jesus revela enquanto ensina a observá-la.
Veja esse texto de Mateus 5,17-20:
Não pensem que eu vim abolir a Lei e os Profetas. Não vim abolir, mas dar-lhes pleno cumprimento. Eu garanto a vocês: antes que o céu e a terra deixem de existir, nem sequer uma letra ou vírgula serão tiradas da Lei, sem que tudo aconteça. Portanto, quem desobedecer a um só desses mandamentos, por menor que seja, e ensinar os outros a fazer o mesmo, será considerado o menor no Reino do Céu. Por outro lado, quem os praticar e ensinar, será considerado grande no Reino do Céu. Com efeito, eu lhes garanto: se a justiça de vocês não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, vocês não entrarão no Reino do Céu.