Em certos ambientes, é muito comum ouvir dizer que a Terra Santa é o quinto evangelho. Isto significa que poder visita-la é como ter a chance de viver uma experiência que proporciona uma aproximação única com o divino, com a nossa fé em Jesus e nos ajuda a entender empiricamente a revelação divina, que historicamente se deu nas terras da Palestina, em Israel. E de fato, é assim.
Durante meus estudos, a partir de 1992, pude viver 4 anos em Jerusalém. E, depois disso, graças a Deus, tive a chance voltar várias vezes. Tenho também o privilégio de ter uma esposa que é biblista e ama Israel e seu povo. Por isso visitar aquela terra é quase como voltar para casa. Mas em tudo isso existe algo que é mais do que afetividade, que certamente tem a ver com o transcendente, com a fé.
No ambiente das religiões monoteístas é normal falar de peregrinação. Entre os judeus, uma frase, normalmente dita quando se despendem ou quando celebram uma festa importante, recorda a vontade de visitar (aliyah em hebraico, literalmente “subir”) a Terra Prometida: Leshaná Habaá BiYerushalaim (próximo ano em Jerusalém). Entre os muçulmanos, outra realidade religiosa presente naquelas terras, é bem-conhecido o preceito de, ao menos uma vez na vida, realizar o Hajj, a peregrinação de cinco dias ao local mais sagrado do Islamismo, em Meca, na Arábia Saudita. Também o hinduísmo e o budismo conhecem o conceito de viagem para um lugar sagrado.
A peregrinação cristã para a Terra Santa, ao invés, tem um outro sentido, desde quando começou essa tradição. O seu interesse básico é trilhar os caminhos que testemunham historicamente a passagem de Jesus nessa terra e viver a memória do evento especial da redenção, quando o divino entrou definitivamente na história humana e Deus se fez pessoa, diminuindo a distância entre o sagrado e o humano.
Poder ver as pedras, as colinas... Sentir o vento, a chuva que cai... Experimentar o calor da terra, a primavera que faz crescer as plantas no deserto da Terra Santa é uma experiência inenarrável e nos coloca em sintonia com a encarnação de Deus na história humana, especialmente na história do povo judeu.
Lugares privilegiados são, sem dúvidas, a Galileia, onde se destacam Nazaré e o Lago em volta do qual Jesus escolheu seus discípulos, e Jerusalém, onde Jesus, através da sua paixão e ressurreição, nos redimiu.
Jerusalém é especial por que é também aquele lugar no qual almejamos estar, no final dos tempos: a Nova Jerusalém, a Jerusalém Celeste do Apocalipse. Já segundo a tradição judaica, no vale de Josafá (= YHWH é o juiz), que atravessa a cidade, todos se reunirão para o juízo universal. Jerusalém se transforma assim em uma metáfora da nossa própria vida: estar em Jerusalém como peregrino (peregrinus = estrangeiro) é como reconhecer o caráter transitório da nossa passagem pela terra, sonhando a pátria celeste. Por isso, nos primórdios do cristianismo, o sonho era ser sepultado em Jerusalém, no vale de Josafá, deixando para trás a experiência terrena, prontos para ressuscitar no último dia.
De maneira mais empírica, em síntese, diria que não é a mesma coisa ler um texto da Bíblia na Terra Santa ou na minha casa. É um privilégio poder estar em Nazaré, na gruta da anunciação, e ler a placa com a inscrição “aqui o verbo se fez carne”... Estar em silêncio no calvário e depois, a 50 metros, visitar o túmulo vazio do Senhor. Sentar num banco de uma praça de Jerusalém e ver os judeus, povo escolhido por Deus...
Toda a experiência que se faz nos lugares santos aumenta a própria fé em um Deus que se encarna, que assume nossos limites e dá esperança à nossa vida, levando-nos a ser melhores e a sonhar com a eternidade.