Não podemos falar dum "antes" da criação do Jardim no Éden. Essa categoria temporal é típica de uma narração histórica, coisa que não acontece nos primeiros capítulos do livro de Gênesis, visto que Gênesis 1 - 11 não tem nada a ver com história no sentido que estamos acostumados a entender. A criação do ser humano e dos animais, como contado em Gênesis 1 e 2, o paraíso (Gn 3), Caim e Abel (Gn 4), o Dilúvio (Gn 6 - 9) e a Torre de Babel (Gn 11) não são eventos que aconteceram em uma data que podemos identificar na cronologia da vida na terra, mas são narrações com elementos mitológicos feitas por pessoas com fé em Deus que refletem, inspirados por Deus, a nossa natureza e a missão humana conforme os planos divinos. O paraído, que a bíblia literalmente chama de "jardim no Éden" (Gênesis 2,8) faz parte do plano de Deus. Coisa fundamental é saber como ler essa narração para identificar aí o plano de Deus para nós.
Existem vários níveis de leitura da presença do ser humano no paraíso. Todas procuram dar uma interpretação dentro da moldura "plano de Deus para a humanidade". O paraíso é o ideal que Deus imagina para a humanidade e para todo o criado. Tentando ler em uma perspectiva bíblica transversal, que esclarece basicamente a mensagem dessa página da Bíblia, a intenção dessa narração é descrever o "jardim de Deus" (veja Ezequiel 28,13 e 31,9), que é o oposto da estepe, da terra árida, sem água (veja Isaías 51,3). No Jardim de Deus tem vida e fora dele há morte.
Elemento essencial do "Paraíso", é a proibição de comer o fruto, transgressão que leva Adão e Eva à expulsão. Parece um verdadeiro paradoxo: um lugar ideal com uma proibição, mas esse “limite” é a condição para a felicidade humana. A árvore da vida é como se fosse um enorme cartaz: o ser humano é criatura e será feliz se obedecer ao Senhor, seu criador! E a tentação que aflige a humanidade, representada pela serpente, é ser autossuficiente, não admitir o seu limite de criatura, pensar que é senhor do criado.
A promessa do “tentador” é que se o homem e a mulher comessem da árvore, seus olhos se abririam e seriam “versados no bem e no mal” e seriam “como deuses”. Aqui está muito evidente o problema e a proposta da serpente: os dois, comendo da árvore, se tornam “deuses”. A árvore está lá exatamente para dizer que tem um Deus que está acima das criaturas. E é esse Deus que estabelece o que é bem e o que é mal. Quando o ser humano pretende ocupar o lugar de Deus, estraga tudo, estraga a ordem e provoca a morte. Esse é o pecado que está sempre batendo à nossa porta e é uma tentação que aflige em todo momento a humanidade. Infelizmente apenas depois do pecado - e nem sempre - o ser humano se descobre nu, limitado no seu erro e as consequências do pecado, muitas vezes, não se podem cancelar, porque inerentes à liberdade dada por Deus à humanidade.
Em síntese: "antes" do jardim no Éden existe o plano de Deus: é Ele quem determina o que é "bem e mal", porque Deus sabe o que leva o ser humana e todas as criaturas à felicidade. Até que esse "limite" é observado, existe o paraíso; quando essa Lei não é mais seguida, existe a ausência do paraíso, com todas as consequências, como aquelas descritas simbolicamente a partir de Gênesis 4.