Alguns textos do Antigo Testamento, para sublinhar a santidade do Templo ou da Arca da Aliança que nele era guardada, mostram como pessoas não "autorizadas", quando tocavam na Arca, morriam. Veja o caso de Oza, em 1Crônicas 13,10. Provavelmente isso leva você a imaginar que toda pessoa "indigna", que entrava no Templo, sofria a "ira" do Senhor. Mas devemos imaginar que  provavelmente esse modo de contar é uma maneira de sublinhar a importância do lugar santo por excelência. E a situação contada em Crônicas é contextualizada no momento em que a Arca da Aliança ainda não estava no Templo, mas "vagava" em terras dos filisteus, cabendo a Davi a tarefa de levá-la a Jerusalém, onde seu filho Salomão construirá o Templo, que será a morada do Senhor.

Nos séculos seguintes da história do povo judeu, a santidade do Templo é marcada pela particularidade do Santo dos Santos (expressão hebraica -  Qodesh ha-Qodashim - para dizer "santíssimo"), lugar mais interno do templo, aonde se encontrava a Arca, aonde entrava somente o sumo-sacerdote, uma vez por ano, na festa do Yom Kippur, dia da purificação. Essa prática seguiu até que o Templo foi destruído, em 70 depois de Cristo, pelos romanos.

 

Fariseus, saduceus e grupos de judeus

Outro elemento que percebemos na sua pergunta é o preconceito que envolve os saduceus e os fariseus.

No mundo dos judeus do tempo de Cristo existiam vários grupos de religiosos. É provável que a maioria dos primeiros cristãos vinham de um grupo ligado ao grupo dos judeus "apocalípticos", que tinham um pensamento muito particular, esperando no juízo divino, na vinda do Messias, que liberaria a humanidade do mal. Os fariseus normalmente são colocados em contraste com os saduceus e também com Jesus. É um modo muito superficial de enquadrar esse grupo de judeus. O próprio Paulo era um fariseu. O nosso juízo sobre os diversos "tipos" de judeus, existentes no tempo de Cristo, sofre muito a nossa concepção de confissões cristãs, que se contrapõem entre elas. No contexto judeu era muito mais fácil ser diferente e não significava necessariamente contraste. O diálogo sobre opiniões diferentes, como o tema da ressurreição, era algo muito comum entre os judeus.

Olhando mais de perto os fariseus e saduceus, obviamente existia diferenças entre eles. Os saduceus eram aqueles que dirigiam o Templo, eram os que estimavam as práticas religiosos realizadas no Templo de Jerusalém e abominavam aqueles que não tinham zelo pelas obrigações relativas ao templo. Os fariseus também eram praticantes, mas eles fizeram com que a religião não fosse apenas a religião do templo, mas do dia-a-dia: o judeu praticava o seu ser religioso nas suas ações quotidianas e não somente nos preceitos relativos ao Templo. Portanto, há algo de muito positivo nesse grupo, que encontramos também claramente nos Evangelhos: eles popularizaram a religião, que passou a ser algo do povo e não só dos sacerdotes, do Templo. É por isso que os vemos "discutindo" com Jesus sobre vários temas. Essa "discussão" não é tensão, como costumamos ler, mas "diálogo", busca teológica. Isso é evidente quando se vê Jesus indo na casa deles, pois se fosse uma simples "briga", um não aceitaria receber o outro na própria casa.

Os Evangelhos podem transmitir uma imagem negativa dos grupos religiosos judeus. É provável que isso é causado pelo fato que os Evangelhos foram escritos já na parte final do primeiro século, quando já era bastante evidente a separação entre judeus e cristãos, coisa absolutamente ausente no tempo de Cristo: Jesus e os primeiros cristãos eram judeus!