Nesse domingo, muitos cristãos ouviram a proclamação do Evangelho de Mateus que conta o famoso milagre de Jesus da multiplicação dos 5 pães e 2 peixes, que alimenta uma multidão de 5 mil homens, “sem contar mulheres e crianças” (Mateus 14,13-21). Comparto aqui algumas ideias que têm estado na minha mente hoje e que podem ajudar você a refletir sobre essa passagem.

 

O contexto

Como sempre, nos Evangelhos, aquilo que serve de contexto para as histórias de Jesus é fundamental, pois é um instrumento para fundamentar e passar a mensagem. Por isso não podemos ignorar os detalhes que antecedem um evento principal, como este da multiplicação dos pães e peixes. Neste caso notamos que, antes do milagre, temos as seguintes informações:

  • Jesus recebe a notícia que João Batista morrera;
  • Jesus sai de barco para um lugar deserto e afastado;
  • A multidão segue Jesus, a pé;
  • Jesus desce do barco e vê uma grande multidão;
  • Tem compaixão do povo e cura quem é doente;

Nós biblistas ainda não temos respostas claras, mas provavelmente João Batista foi alguém fundamental no percurso histórico de Cristo. Normalmente seguimos dizendo que João foi aquele que indicou Jesus, sublinhando o seu protagonismo como enviado por Deus. E é isso que os evangelhos contam; portanto não temos outras informações para fazer hipóteses, todavia é provável que a relação entre Jesus (e os primeiros cristãos) e o Batista é algo maior do que pensamos. De fato, resulta evidente, na passagem que estamos tratando, que a morte dde João afeta Jesus, que se retira, quem sabe para pensar na sua missão, nos próximos passos a dar.

O evento dramático da morte de João faz com que Jesus “contemple” a realidade, analise a situação. O primeiro impulso é aquele de afastar-se. Certamente o silêncio, a oração e a distância ajudam a ter sobriedade e ver, com clareza, a vontade divina. É essa “meditação” que permite a Jesus “ver” a multidão que lhe segue e ter aquele sentimento que será fundamental para a sua missão: a compaixão. Mateus sublinha: "encheu-se de compaixão por eles".

Esse sentimento não pode ser confundido com a pena, mas é algo que vem de dentro, do estômago como dizem os semitas, e transforma a nossas vidas, que não nos deixa indiferentes, que nos impele a agir, a “estar com”, a fazer alguma coisa para mudar. É por causa disso que Jesus começa a curar os doentes, pois ter compaixão não pode ser só um sentimento platônico. Todavia, o bem-estar físico, embora necessário, não é a única coisa que queria transmitir Jesus.

 

O milagre da multiplicação dos pães e peixes

Esse milagre traz consigo várias mensagens, que não se excluem, mas se completam. A essas que exponho aqui, você pode acrescentar as suas interpretações e assim ajudaremos a esse texto se tornar atual e verdadeiros em nossas vidas.

Como Jesus, também os apóstolos têm compaixão do povo. Pensam no seu bem-estar e têm consciência que não podem satisfazer à necessidade eminente de alimento. Eles apresentam a Jesus o problema, mostrando assim a compaixão que tinham: “Este lugar é deserto e a hora já está adiantada. Despede as multidões, para que possam ir aos povoados comprar comida!”. Essa compaixão dos discípulos é o ponto de partida, mas Jesus lhes ensina que não basta essa compaixão descomprometida: “Eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos de comer!”.

A compaixão deve levar à ação, excluindo os limites: “lugar deserto”, “hora adiantada”, “só 5 pães e dois peixes”. Tudo isso representam ainda a nossa falta de coragem de deixar acontecer a "compaixão", que deve brotar espontaneamente do "estômago", das entranhas.

A compaixão leva à atuação e não apenas à denúncia, esperando que sejam outros a resolver, tirando de si mesmos a responsabilidade. O pouco que se pode dar é transformado e se torna em muito, com Deus.

Resolver a questão material é um passo importante, mas não é aquele fundamental. É a palavra de Deus que sacia em abundância a multidão. É o seguimento de Cristo que satisfaz, que leva à plenitude e à abundância.