Uma, dentre várias, das passagens que mais nos toca na leitura dos evangelhos é, certamente, a de Marcos 1, versículos 40-45, cuja narrativa apresenta-nos um leproso, num recanto da Galiléia, considerado extremamente impuro que, ao ver, à distância, Jesus, grita-lhe: "Se queres, pode limpar-me!".

De acordo com a lei mosaica, além de, conscientemente, considerar-se indigno, impuro e, por isso, não poder tocar ninguém, devia se afastar de toda a sociedade, pois era considerado um pecador diante de Deus. E nada poderia manchar a santidade de Deus, razão pela qual os judeus se apegavam aos rituais de pureza extrema, muito mais voltados às questões de higiene que, propriamente, de consciência. Para Jesus, não são as mãos sujas, a lepra, a doença; nem aquilo que entra pela boca do homem que o torna impuro, mas, pelo contrário, aquilo que sai do seu coração (cf. Mt 15, 11).

Dessa forma, Jesus rompe as barreiras entre aquilo que se considerava Sagrado e o profano. É Deus, na Santidade de Jesus, que vai de encontro do impuro (leproso), invertendo totalmente o conceito de santidade e de pureza ao ponto de valorizar o ser humano, de curá-lo, isto é, libertá-lo, salvá-lo de suas mazelas e corruptelas da vida. Jesus responde ao leproso muitas vezes ignorado pela sociedade que não lhe dirigia sequer a palavra: "Eu quero, sê curado!". Hermeneuticamente, nós somos e toda a Igreja também é aquele leproso que grita a Jesus porque somos também leprosos, imundos, necessitados de cura.