Prezado Marcos, não está correto dizer que "o céu para Deus já está completo de almas". A questão que você põe é muito importante e confunde as idéias de tantos. Envolve diversos aspectos teológicos, tais como a liberdade, mas, sobretudo o tema da predestinação. Vamos ver se consigo ser objetivo.

A questão da predestinação é realmente um ponto teológico muito delicado. Muita gente acredita que se nasce, por exemplo, pobre porque isto estava escrito, ou, conforme a sua pergunta, nascemos para cumprir determinada missão, ou seja, com o destino marcado. O pior é que às vezes dizemos que estava escrito por Deus. Isto é absolutamente falso e trata-se de uma compreensão errada da teologia. Esta compreensão pode derivar da Bíblia. De fato a Bíblia fala de predestinação e aquilo que diz precisa ser lido com muito cuidado.

No Antigo Testamento não se usa nunca o termo "predestinação", porém no Novo Testamento encontramos diversas citações que mencionam esse conceito. Isso aparece sobretudo em Paulo. É ele, de fato, que desenvolve a teologia da predestinação. Encontramos esse argumento sobretudo em Romanos 8,28-30; 9,6-13 e no hino de Efésios 1,3-11. Nessas passagens encontramos frases como:
"Os que de antemão ele conheceu, esses também predestinou a serem conformes à imagem do seu filho (...) Os que predestinou, também chamou; e os que chamou, também os justificou, oe sque justificou, também os florificou"(Romanos 8,29-30). "Ele nos predestinou a sermos seus filhos adotivos"(Efésios 1,5).

Entender o que a Bíblia nos diz com esse termo significa ler com atenção esses textos, mas todo o texto e não apenas frases como estas que citamos acima.

A primeira constatação que se sublinha é que quando Paolo fala em predestinação não a trata nunca a partir da ânsia humana de saber se entramos ou não no número dos eleitos.
A segunda é que não é nem Cristo, nem o Espírito que predestina, mas somente Deus. Com isso não se relativiza o papel de Cristo e do Espírito, mas se afirma a íntima conexão que existe entre predestinação e chamada. De fato, em Paulo, é sempre Deus que chama.
Terceira, o conceito de predestinação não é nunca algo abstrato, pré-temporal ou pré-histórico, mas sempre espressão de uma relação positiva de Deus com o homem que se exprime, sobretudo no Antigo Testamento, com a Aliança. A predestinação se realiza dentro da aliança de Deus com os homens, que é uma aliança otimista, positiva onde se sublinha a proeminência da graça de Deus, antes de qualquer concretização histórica.

Sem prolongar ulteriormente as elucidações teológicas, concluímos que a predestinação existe para todo o ser humano. De fato Deus escolhe a todos, independentemente da sua história. E esta situação não dipende do homem. É uma graça que recebe, independentemente da sua vontade. Porém não é dada apenas a alguns, excluíndo outros. Todos são predestinados em Cristo. É a história de cada um, as escolhas feitas e o caminho escolhido pessoal ou comunitariamente que determinam o sucesso dessa aliança, que para ser eficaz exige o concurso das duas partes.
Não existe destino, mas predeterminação à união com Deus, como entendeu muito bem Santo Agostinho, que diz: "nosso coração não fica em paz enquanto não repousa em Deus". Todo homem é livre, e esse é o dom maior que Deus nos deu. Dentro dessa liberdade conduz a sua vida e controi o seu destino. Pensar que Deus não dá a liberdade ao homem, mas invés determina o seu futuro, é limitar a grandeza de Deus e simplificar a natureza humana.

Quanto à Maria, Deus, falando em termos meramente humanos, condicionou a história da salvação ao sim de Maria. Parece uma coisa absurda, mas aí está a grandeza divina: a sua confiança no ser humano. De fato amou o homem até às últimas conseqüências. Chama cada um a dar o seu sim, mas não nos obriga a fazê-lo, embora saiba que a nossa felicidade depende efetivamente da resposta positiva. Deus nos deixa livre e não nos obriga a seguir a sua "predestinação". A resposta à chamada é missão de cada um. Além da chamada Deus dispõe a sua graça, com a qual podemos contar sempre.