Não, Marcos, o livro de Jó não foi escrito por Moisés. O texto tem um tom patriarcal, sobretudo no relato em prosa dos primeiros capítulos, e isso fez com que, antigamente, se pensasse que o livro fosse obra de Moisés.

Uma análise cuidadosa dos conceitos presentes no livro mostram claramente que ele só pode ter sido escrito depois de Jeremias e Ezequiel. Em relação à linguagem utilizada, é conhecida a presença de aramaísmos, isto é, palavras que provém da língua aramaica. E isto nos leva a concluir que o livro foi escrito apenas depois do exílio do povo na Babilônia, entre os anos 500-400 antes de Cristo. Estamos há mais de 500 anos da morte de Moisés! Coisa comum a vários livros bíblicos, não conhecemos o verdadeiro autor do livro.

 

Jó é a obra prima da literatura do movimento sapiencial. Fala de um servo de Deus, rico e feliz. Deus permite a Satanás de provar a sua fidelidade, para ver se continuaria fiel na desgraça. Jó, por isso, é atormentado por uma doença repugnante e dolorosa. Jó se mantém conformado e censura quem o aconselha a amaldiçoar a Deus: a esposa e os seus três interlocutores. No final Iahweh censura quem convidava Jó à revolta contra Deus e devolve a ele filhos e seus bens em dobro.

 

O tema central desse livro é o problema do justo sofredor. Havia uma idéia dominante segundo a qual cada um deve ser tratado segundo as próprias obras. Daí nasce espontânea a pergunta: como pode um justo sofrer? E há justos que sofrem cruelmente, como demonstra a situação de Jó.

O leitor sabe, pelo início do livro, que o sofrimento de Jó não vem de Deus, mas de Satanás. Jó e seus amigos, porém, não sabem. Para eles vige a idéia tradicional: a felicidade dos ricos dura pouco e a desgraça dos justos prova a própria virtude. Os três amigos de Jó sublinham que o sofrimento é por causa de alguma culpa: Deus aflige o sofrimento para a expiação de pecados ou culpas inadvertidas ou ainda para prevenir faltas mais graves e curar o orgulho.

 

Jó não nega a retribuição terrena - e no fim ela lhe é concedida - mas a reflexão do livro é muito mais profunda. Na sua desgraça, Jó luta para encontrar Deus, que parece se afastar. E quando Ele aparece é para reduzir Jó ao silêncio. Isso significa que a pessoa que sofre deve persistir na fé, até encontrar o sossego.

 

Naquele momento histórico, essa mensagem era muito inovativa. É verdade que não é a mensagem cristã, ainda. De fato não existia ainda a concepção da vida eterna e por isso a reflexão não podia dar as respostas que temos hoje, isto é: a recompensa na vida eterna e o valor do sofrimento como participação na paixão de Cristo. Nesse sentido nos iluminam, respectivamente, dois textos de Paulo: Romanos 8,18 e Colossenses 1,24.