A Campanha da Fraternidade de 2012, com início na quarta feira de cinzas, no dia 22 de fevereiro, organizada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) vai tratar da questão da Saúde Pública.
A Campanha da Fraternidade, vivida durante quaresma e estendendo-se para todo o ano, faz um apelo e um convite à conversão. De modo que, ao longo da quaresma se insiste para alargar o horizonte da vivência da fé, trazendo para reflexão das comunidades atuantes, sempre um tema de cunho social, identificado como causador de morte e sofrimento, suscitando ações que transforme a vida da sociedade, segundo o Evangelho de Jesus Cristo.
O tema proposto pela Campanha da Fraternidade: é Fraternidade e Saúde Pública e tem com o lema: que a Saúde se Difunda sobre a Terra (cf. Eclo 38, 8). A saúde integral da pessoa humana é o que mais almejamos encontrar. Já faz tempo, que a saúde vem sendo preocupação vital é a mais veemente revindicação da população brasileira no campo das políticas públicas.
A conversão à fraternidade a partir de Eclesiástico 38,8
As religiões procuraram oferecer respostas à busca de um sentido à dor, ao sofrimento, ao mal e à morte, que afligem a humanidade. Poderíamos a título de introdução ouvir não só os ensinamentos bíblicos, mas buscar as considerações da Teologia e da prática pastoral da Igreja para iluminar a questão da saúde, entretanto queremos neste momento pontuar e assinalar aspectos que brotam da palavra de Deus. Do livro do Eclesiástico e algumas considerações do Novo Testamento. Deixamos para que outros apresentem também suas colaborações na reflexão deste tema.
A busca da Saúde pela Humanidade e na Bíblia
Desde sua origem a humanidade procurou conservar a saúde e atacar e vencer as doenças que se manifestavam. Muitos povos passaram acreditar que a doença surgia por causa da maldade e do pecado do ser humano (Judaísmo), por erros cometidos em outras vidas, por castigo de divindades ofendidas pela ação do homem, pela atuação de maus espíritos e demônios.
A crença que as divindades podiam curar os males, da início a diagnósticos, receitas curativas formulas mágicas ervas medicinais com poder curativo aliada a orações e dizeres. Desta forma passou-se acreditar que a cura das doenças tem haver muito com a divindade aliando doença e religião.
A cura da doença e a saúde nas páginas do Antigo Testamento
É no livro do Eclesiástico que vamos encontrar as mais belas citações que dizem respeito à cura da doença e a saúde. Vejamos esta:
“é melhor a morte do que a vida cruel, o repouso eterno do que uma doença constante”.(Eclo 30,17)
Nesta passagem do livro do Eclesiástico a doença é caracterizada como o pior de todos os males. No capítulo seguinte encontramos:
“As preocupações do dia não deixam dormir, e mais do que uma doença grave tiram o sono” (Eclo 31,2).
A leitura do texto bíblico vai mostrando que o Judaísmo entendia que a falta de saúde estava intimamente ligada à culpa e ao pecado. A pessoa tinha cometido algo errado ou até seus pais ou antepassados. A oração era o que buscavam em primeiro lugar para obter a clemência de Deus e a cura. A passagem do segundo livro de Samuel é incisiva:
“Iahweh feriu a criança que a mulher de Urias dera a Davi e ela caiu gravemente enferma. Davi implorou pelo menino: jejuou, ficou junto dele, e passou a noite prostrado no chão...” (2 Sam 12,15-2)
No livro dos salmos encontramos os doentes que suplicam a Deus a cura, de seus males e enfermidades.
Assim ao longo do texto do Antigo Testamento encontramos muitas passagens que relacionam pecado e doença e que tanto um como a outra recebem de Deus perdão e cura através da oração.
A novidade no livro do Eclesiástico
Nas páginas do livro Eclesiástico encontramos um novo modo de entender a doença e mais ainda, indica um comportamento diferente na busca da cura da doença. Se alguns textos do Antigo Testamento consideram como falta de fé no Deus Altíssimo recorrer à medicina e a seus profissionais o Eclesiástico passa a considerar os remédios, os médicos e a ciência como possibilidades de cura e sabedoria vinda do próprio Deus e, consequentemente, devem ser buscados sempre que necessário.
O livro do Eclesiástico e a saúde
O livro do Eclesiástico se apresenta como uma coleção de ensinamentos que eram usados diariamente pelo povo. O autor viu a necessidade desta sabedoria não se perder e quis conservá-la. Este fato ajudou a população a não esquecer sua cultura e raízes e resistir a uma nova cultura imposta pelos dominadores. O autor foi sábio em querer conservar a sabedoria popular e a autoestima deles e da tradição dos antepassados. Assim vamos encontrar no livro do Eclesiástico coleções de ditos dos mais diversos. O lema da Campanha da Fraternidade foi tirado de uma destas coleções que argumenta sobre a saúde: “Que a saúde se difunda sobre a Terra” (Eclo 38,8). Nesta coleção de ditos sobre a Medicina, a missão dos médicos, outros profissionais, cura e a saúde o versículo oito é central nesta coleção de ditos.
O conteúdo do livro do Eclesiástico resulta da coleta de um conjunto de ensinamentos que circulava no meio do povo. O autor desejou deixá-los por escrito para manifestar a resistência contra os dominantes da época que queriam impor sua cultura e ciência, tirando do povo de Israel sua autoestima e negando sua sabedoria. Muitas vezes, os ditos são dispostos de maneira a constituir pequenas coletâneas, como no caso do verso que inspirou o lema da Campanha da Fraternidade deste ano: “Que a saúde se difunda sobre a Terra” (Eclo 38,8). Este é o verso central de uma coleção de ditos sobre a saúde e sobre a missão dos profissionais que trabalham na saúde.
Do texto do livro do Eclesiástico (Eclo 38,1-15), outros ensinamentos podem se dirigir a área da saúde pública, ele faz referência às pessoas responsáveis pela manutenção da saúde da população. Parece que o texto tem longo alcance e fala do trabalho do médico e do farmacêutico no trabalho de evitar que as pessoas adoeçam e ajudá-las para que tenham saúde em abundância, o texto esta falando da prevenção das doenças. O ditado popular consagrou: “É melhor prevenir que remediar”.
A cura a doença e saúde nas páginas do Novo Testamento
Jesus veio com uma missão muito clara e definida. Veio trazer vida e vida em abundância a tudo o que causava exclusão social. O sistema que o Império Romano impôs nos países conquistados, gerava um sistema de morte e de doença. Por isso os Evangelhos constantemente mostram Jesus curando e devolvendo a saúde, ao paralítico, ao cego, ao doente, ao leproso, a pecadora pública, e por fim ressuscitando Lazaro. Para mostrar que ele tinha poder sobre a vida e a morte.
A missão de Jesus é apresentada na abertura do evangelho de Lucas na sinagoga de Nazaré: evangelizar os pobres, libertar os presos, recuperação da vista dos cegos e liberdade os oprimidos (Lc 4,19). Mas, Jesus foi muito além em sua ação, encontramos inúmeros gestos demonstrando a preocupação de recuperar a saúde, isto significava, uma vida digna, a volta a sociedade, porque a doença significava no seu tempo a exclusão social. (lembro o caso dos leprosos).
O Evangelho de Mateus no capitulo 4,23 fala da missão de Jesus:
“Jesus percorria toda a Galileia ensinando em suas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino e curando toda e qualquer doença ou enfermidade do povo” (Mt 4, 23).
Jesus cura as enfermidades e perdoa os pecados
Em Jesus é destacado não só o poder de curar todas as enfermidades, mas vai além disto perdoa os pecados. Este poder de perdoar os pecados não foi entendido pelos fariseus e os doutores da lei de sua época, por este motivo planejavam uma forma de matá-lo. Jesus veio curar o homem inteiro, alma e corpo; Jesus é o verdadeiro médico que os doentes necessitam.
Jesus vendo tamanho sofrimento Sua compaixão para com todos aqueles que sofrem é tão grande que Ele se identificou: “Estive doente e me visitaste” (Mt 25, 36). Seu amor de predileção pelos enfermos não cessou, ao longo dos séculos, de despertar a atenção toda especial dos cristãos para com todos os que sofrem no corpo e na alma. Esse amor está na origem dos incansáveis esforços para aliviá-los.
Bom Samaritano: paradigma do cuidado
A parábola do Bom Samaritano mostra um aspecto da pratica de Jesus em relação ao próximo: nos convida a termos o cuidado da nossa saúde e da saúde de nosso semelhante. A parábola do Bom Samaritano contada por Jesus evidência neste tempo quaresmal e da Campanha da Fraternidade, a figura do Bom Samaritano como um exemplo a seguir, o cuidado aos doentes e o que esperamos que os profissionais e servidores da saúde façam. O ensinamento da parábola indica uma verdade cristã e ao mesmo tempo humana e universal.
Esta Parábola pela grandeza de seu ensinamento inspira na atualidade ações designadas com o nome “Bom Samaritano” e mais ainda com o mesmo nome as atividades em favor dos seres humanos que sofrem ou precisam de ajuda.
A partir desta parábola, a Campanha da Fraternidade tem uma importante chave de leitura e de compreensão naquilo que se refere à solidariedade, como também da fragilidade e dasmáscondições do trato da recuperação da saúde humana que estamos envolvidos desde a criação.
Um relato da criação do homem e da mulher apresenta a importância da dignidade humana. Somos na realidade imagem e semelhança de Deus. Devemos enxergar em nosso semelhante à figura e o rosto de Deus estampado nos rostos humanos. Outro relato apresenta o oposto, isto é a fragilidade humana. Somos feitos do húmus do barro da terra. De fato, os dois relatos da criação do homem e da mulher, de alguma maneira, nos remetem a essa ambiguidade que nos constitui. O primeiro relato sublinha a dignidade humana. Nós somos imagem e semelhança de Deus. E o outro, relato, fala fragilidade humana.
O ensinamento da Parábola do Bom samaritano
A nossa vida é colocada diante da fragilidade humana da maldade e do abandono. A mesma Parábola coloca para os seguidores de Jesus o ensinamento da descoberta da importância do cuidado na doença e a busca da cura na enfermidade. Aprendemos com a parábola que a fragilidade humana se cura com a proximidade, (o Bom Samaritano nos ensina isto), da pessoa disposta a cuidar do que está fragilizado.
O Bom Samaritano, que aparece como figura importante na parábola assume a condição de modelo para o trabalho pastoral e evangelizador da Igreja no campo da saúde.
Considerações finais
Com a inspiração destes textos bíblicos vindo do Antigo e Novo Testamento, em particular da pratica de Jesus, somos impelidos a dar início à caminhada penitencial do tempo quaresmal deste ano.
Buscando construir a fraternidade no campo da saúde, tão visada, combatida, e desconsiderada em nosso país. Nossa pratica quaresmal poderá, dependendo do nosso empenho criar elos e condições de chegarmos a Páscoa de Jesus transformando a nossa vida e a vida da sociedade segundo a pratica fraterna de Jesus.