Falar detalhadamente, como você pede, de Cristo no Apocalipse implicaria num verdadeiro tratado específico de cristologia. O espaço que temos aqui nos limite a indicar alguns aspectos da figura de Jesus no último livro do Novo Testamento, que aparecem sobretudo nos inúmeros títulos que são dados a Ele no livro .

Globalmente falando, Jesus representa, sem dúvida, a figura central do Apocalipse. Especialmente nesse livro, Jesus é apresentado de manera muito original em comparação com os outros escritos do Novo Testamento.

Para comprender melhor esse assunto, é necessário partir do termo com o qual o Livro é conhecido: "apocalipse", palavra grega, que significa "revelação" e, mais exatamente, a revelação da presença e da ação de Jesus ao lado do seu povo na sua história concreta.

O conteúdo do livro, exprimido na linguagem simbólica própia do gênero literário apocalíptico (a literatura apocalíptica é muito antiga e textos desse gênero existiam já na época do Antigo Testamento, inclusive aparecem no própio AT e também no NT), tem o objetivo de educar os fiéis a descobrir os traços da presença e da ação do Ressuscitado na história da Igreja e ensinar como permanecer fiéis a Ele nas provas e nos desafios.

Depois dessa apresentação, podemos considerar melhor a figura de Jesus através dos vários títulos, descobrindo o que eles significam. Esses títulos resumem as differentes "qualidades" de Jesus, indicam o que Ele é e o que Ele faz. No tempo pos-pasqual, quando Jesus nao é mais visível ao olhos, o cristão tem que saber como reconhecê-lo, para comprender que Ele está presente, como e onde Ele age e quais os sinais que mostram que Ele continua vivo no meio da sua Igreja.

Elencamos aqui os títulos:
Aquele que segura as sete estrelas em sua mão direita, o que anda em meio aos sete candelabros de ouro (2,1)
O Primeiro e o Último, aquele que esteve morto mas voltou à vida (2,8)
Aquele que tem a espada afiada, de dois gumes (2,12)
O Filho de Deus, cujos olhos parecem chamas de fogo e cujos pés são semelhantes ao bronze (2,18)
Aquele que tem os sete espiritos de Deus e as sete estrelas (3,1)
O Santo, o Verdadeiro, aquele que tem a chave de Davi (3,7)
O Amém, a Testemunha fiel e verdadeira, o Princípio da criação de Deus (3,14)
O rebento (= a raiz) da estirpe de Davi, a brilhante estrela da manhã (5,5; 22,16)

A maioria dessas expressões estam nas "cartas às sete Igrejas", na primeira parte do Livro. São auto-apresentações" do própio Cristo, o qual quer ser reconhecido assim pelas comunidades as quais Ele fala. Esses títulos têm raízes no Antigo Testamento e numa simbologia típica que aqui não podemos aprofundir, mas globalmente se referem às qualidades divinas de Cristo, que guia as igrejas, conhece e revela seus pecados e suas boas qualidades, julga as situações das comunidades e sugere os remédios. Mas tambem apresentam Jesus como Deus que permanece sempre ao lado dos fiéis e os guia como faz o Re Davi, caminhando na frente deles e vencendo sempre. A meta é alimentar a confiança nEle e assim de reforçar e encorajar as comunidades.

Além dos títulos apresentados, individuamos também uma qualidade muito importante de Cristo apresentada pelo autor da Apocalipse: a sua ligação com a pessoa de Davi, o santo rei de Israel. Essa ligação tambem é traduzida com alguns títulos:

- A Testemunha Fiel, Primogênito dos Mortos, Príncipe dos reis da terra (1,5; 3,14; 19,11; cf. Sal 89 que se refere a Davi)
- Aquele que tem a chave de Davi (3,7)
- O Leão da tribo de Judá, o rebento(= a raiz) de Davi (5,6; 22,16)
- O Filho varão que regerá todas as nações com cetro de ferro (12,5; 19,15; cf. Sal 2 que se refere a Davi)
- O Rei dos Reis e Senhor dos Senhores (19,16)

A insistência sobre o reinado davídico de Jesus tem uma razão. No capitulo 5, a primera vez que o autor do Livro apresenta Jesus-Davi, ele o insere numa moldura onde Cristo é sobretudo Cordeiro. Essa espressão no Apocalipse se refere ao mistério da vida e da morte de Jesus. Para o Autor do Apocalipse tudo isso significa que temos que ter presente simultaneamente as duas figuras, quando falamos de Cristo: Ele é rei e cordeiro. O cordeiro esta "de pé, como imolado" (5,8) e depois: "pois foste imolado e, por teu sangue, resgataste, para Deus, homens de toda tribo... e eles reinarão sobre a terra (5,10). O Cristo é rei porque foi imolado, porque passou pela paixão e pela morte. O seu reino é um reino que tem o selo do amor que serve, que dá a vida e resgata. Não é um reino como aqueles da terra. O cristão não pode crer num reino diferente daquele caracterizado pelo servir até às últimas conseqüências.

A qualidade "davídica" de Jesus indica quem é Ele e como age, e, ao mesmo tempo, revela algo sobre a própia Igreja. Como Ele é "raiz", ela é "descendência davídica", povo de reis destinado a superar sempre as provas e os desafios da vida, como está escrito nas promessas feitas a cada cristão que vence: "conceder-lhe-ei autoridade sobre as nações; com cetro de ferro as apascenterá... (2, 27 cf. Sal 2), e ainda "eu serei seu Deus e ele será meu Filho" (21,7; cf. Sal 89; 2 Sam 7,14).

Essas são apenas algumas indicações iniciais para ajudar na sua reflexão.