Seria importante entender bem o contexto de onde nasce essa pergunta, pois uma resposta poderia influenciar em modo negativo uma situação de conflito. É comum, por exemplo, vermos pessoas que querem se dedicar de forma mais radical à vida eclesial, seja como membro ativo de uma comunidade ou como seminarista, e serem duramente criticados pelos próprios familiares. Tal situação cria um conflito que expõe ambos a uma situação que, de jeito nenhum, não é aquela almejada para a vida de um cristão. Os familiares pensam terem argumentos justos para a crítica e a pessoa que se engaja busca na fé, na Bíblia, a justificação para o seu comportamento.

Na Bíblia, se procuramos, encontramos passagens que pedem um comportamento radical do seguidor de Cristo. Por exemplo, ao homem rico (Marcos 10,17-22) Jesus diz: "Vai, vende tudo e dá aos pobres". E, enquanto subia pra Jerusalém, Jesus diz a alguém: "Segue-me". Este respondeu: "Permite-me ir primeiro entrerrar meu pai". Jesus replicou: "Deixa que os mortos enterrem seus mortos; quanto a ti, vai anunciar o Reino de Deus (Lucas 9,59-60). Outra pessoa, como conta sempre Lucas, se aproximou de Cristo dizendo: "Eu ti seguirei, Senhor, mas permite-me primeiro espedir-me dos que estão em minha casa".  Jesus, porém, lhe respondeu: "Quem põe a mão no arado e olha para trás não é apto para o Reino de Deus" (Lucas 9,61-62).

 

Em primeiro lugar a relação

Quando nos apaixonamos por alguém ou algum ideal damos um pulo que consiste na superação do "eu", alcançando um nível superior, de onde se vê tudo numa outra perspectiva, que para nós representa a totalidade. É isso que Jesus pede às pessoas que querem segui-lo. Todavia o cerne não está no abandono da família, no conflito. O bom relacionamento é uma meta; a vida pacífica, com boas relações, é um ideal cristão, que deve ser perseguido.

A pessoa que encontrou um ideal se considera livre, pronta para trilhar uma estrada própria. Por isso, às vezes, pensa que pode agir e não só re-agir, ou seja, pode viver uma outra realidade, que antes não existia.

Uma pessoa 'apaixonada' (pelo ideal cristão, por exemplo) deve, todavia, saber também que essa sua situação, exatamente por causa da liberdade que alcançou, pode levá-la a cometer injustiça, a mentir, a procurar a própria glória, a não ver e a não querer outra coisa a não ser a si mesma, a ter a mente cheia de ideias vãs, que podem levar até mesmo ao ódio.

Pelas razões indicadas acima, o ideal, o amor precisa ser 'vigiado', disciplinado, ordenado. Para isso, a melhor coisa a ser feita é colocar o próprio ideal em relação a uma dimensão maior que pode ser a própria família ou, em termos mais absolutos, em relação à verdade, à justiça, à harmonia, à paz, a Deus e a tantos outros valores sublimes.

 

Concluindo

Na nossa vida, em primeiro lugar vem o próprio ideal. Se for a vida cristã, Deus, ele vem primeiro. Todavia esse valor sublime não exclui outras realidades da própria vida, mas as ilumina com nova luz, valorizando-as ainda mais. Um monge que, por causa da sua vocação, se retira para o resto da vida para um mosteiro, não abandona a própria família, mas continua amando-a, provavelmente mais do que antes. Obviamente a mesma atitude deve existir em senso contrário: também a família deve valorizar a escolha do próprio membro. Se não existe harmonia, há algum aspecto que não está perfeito e precisa ser trabalhado.