Não, Donizete. Jesus, ao contrário, sublinha, como veremos abaixo, que as situações de sofrimento não são necessariamente ligadas ao pecado. Mas a sua pergunta é legítima, pois no tempo de Cristo muitas pessoas pensavam assim. E se baseavam na Bíblia, pois no Antigo Testamento podemos escavar um fundamento para tal ideia. Por exemplo, Êxodo 20,5, no contexto do decálogo, diz:
Sou um Deus ciumento, que puno a iniquidade dos pais sobre os filhoos até a terceira e a quarta geração dos que me odeiam.
Há dois textos no Novo Testamento que mostram claramente o pensamento de Cristo sobre esse tema. O primeiro deles é Lucas 13,1-5. Nessa passagem Jesus reflete sobre algumas situações de desgraças acontecidadas no seu tempo, como a morte de 18 pessoas durante a queda acidental de uma torre. Ele interroga seus ouvintes: "Julgais que a sua culpa tenha sido maior do que a de todos os habitantes de Jerusalém? Não, eu vos digo."
O outro texto, mais inerente à sua pergunta, está no capítulo 9 do Evangelho de João. O evangelista conta que, diante da presença de um cego de nascença, os discípulos de Jesus lhe perguntam: "quem pecou, ele ou seus pais?" Jesus então lhes responde: "Nem ele nem seus pais pecaram, mas é para que nele sejam manifestadas as obras de Deus."
Mas não podemos terminar essa breve explicação sem deixar de dizer que pode existir uma ligação entre sofrimento e pecado. Nessa perspectiva, porém, é preciso alargar o conceito de pecado, frisando que ele nos afasta não só de Deus, mas também do nosso próximo, da nossa chamada pessoal. Se crio situações que me afastam seja de mim mesmo que do meu próximo, isso provoca uma situação de desconforto e consequente sofrimento. Precisamos, todavia, tomar cuidado e não pensar que quem não sofra não é necessariamente pecador, pois há cristãos santos, de vida exemplar, que sofrem muito. E conseguem transformar esse sofrimento em graça, coisa muito distinta do pecado. Esse tema é o cerne do livro de Jó.