Esta é uma história muito interessante que só aparece no Evangelho de João. O texto diz que uma mulher foi pega em adultério e por este motivo deve ser apedrejada. Que pecado ela cometeu para ser trazida diante da comunidade e ser condenada à morte? Vamos ver o que a Torá (Lei) nos diz sobre isso:
“Se um homem adulterar com a mulher do seu próximo, será morto o adúltero e a adúltera” (Lv 20,10).
Observamos que a Torá diz que os dois serão mortos, tanto a mulher quanto o homem. Mas não diz que eles devem ser apedrejados.
No Evangelho notamos duas coisas: Não existe um homem, somente a mulher e esta deve ser apedrejada. Portanto, a pergunta é: de que pecado se trata? O que significa ser adúltera neste texto?
Na realidade se trata de outro tipo de pecado, vejamos o texto da Torá no qual está escrito que tipo de pecado ela cometeu:
“Quando no meio de ti, em alguma das tuas cidades que te dá o Senhor, teu Deus, se achar algum homem ou mulher que proceda mal aos olhos do Senhor, teu Deus, transgredindo a sua aliança, que vá, e sirva a outros deuses, e os adore, ou ao sol, ou à lua, ou a todo o exército do céu, o que eu não ordenei; e te seja denunciado, e o ouvires; então, indagarás bem; e eis que, sendo verdade e certo que se fez tal abominação em Israel, então, levarás o homem ou a mulher que fez este malefício às tuas portas e os apedrejarás, até que morram”. (Dt 17,2-5)
Para compreendermos melhor este texto temos que saber que a Escritura, para falar do relacionamento entre Deus e Israel, usa a linguagem do casamento. Deus é o esposo e Israel é a esposa. No momento em que a comunidade é fiel, Israel é tratada como a virgem de Israel. Há circunstâncias em que ela é infiel e aí ela é chamada de prostituta, ou adultera; e há também circunstâncias em que ela faz o papel de viúva, como se o esposo estivesse morto, então Israel é apresentado na figura da viúva. Estes quatro aspectos: virgindade, prostituição, adultério e viuvez caracterizam a Escritura e o mesmo tipo de linguagem aparece no Novo Testamento.
Percebemos então que o pecado da mulher é o de infidelidade, não se trata de uma transgressão na área do sexo. Ela foi infiel não a um homem, mas a Deus. Houve uma transgressão da Aliança de algum modo e neste caso, segundo a lei, ela deve ser apedrejada.
Os escribas e fariseus tinham razão, a “Lei ordena apedrejar tais mulheres”. “Mas Jesus, inclinando-se, escrevia na terra com o dedo.” Este gesto de Jesus é muito significativo e aparece apenas uma vez na Escritura.
“Quando Ele terminou de falar com Moisés no monte Sinai, entregou-lhe as duas tábuas do Testemunho, tábuas de pedra, escritas pelo dedo de Deus.” (Ex 31,18).
As tabuas de Pedra escritas com o dedo de Deus é a Torá, a Aliança entre Deus e o povo de Israel. Este gesto de Jesus de escrever com o dedo nos leva a refletir sobre duas realidades; primeiramente que Ele é o próprio Deus que se abaixa para estar com a humanidade; em segundo lugar quer recordar quantas vezes na história de Israel houve infidelidades, e quantas vezes Deus lhe perdoou.
Mas eles persistiam em interrogá-lo, então, ele se ergue e diz: “Quem de vós estiver sem pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma pedra!”. Ele se inclina novamente e continua a escrever. Com esta frase de Jesus eles caem em si e percebem que são pecadores. Logo, começam a sair um após o outro, começando pelos mais velhos.
Poderíamos explorar mais este conceito de infidelidade, no entanto, o mais importante é reconhecermos nossa condição de criaturas. Todos nós temos as mesmas dificuldades. Deus na sua infinita bondade nos perdoa sempre.