O jejum – junto com a oração, a esmola e outros gestos de caridade – pertencem, desde sempre, a vida e a pratica penitencial da igreja desse o inicio do cristianismo e tem suas raízes no judaísmo. Estes três pilares respondem à necessidade permanente do cristão de conversão ao reino de Deus, de implorar a ajuda de Deus, de pedir perdão, de ajudar aos que precisam e de dar graças a Deus por tantas maravilhas que Ele nos dá todos os dias.
O jejum dos cristãos encontra seu modelo e seu significado em Jesus. É verdade que o Mestre não impõe um modo explicito aos discípulos de nenhuma pratica particular de jejum e abstinência, mas, lembra a necessidade do jejum para lutar contra o maligno. Quarenta dias de jejum precedem o combate espiritual das “tentações”, que Jesus enfrenta no deserto e que supera sempre usando a Palavra de Deus. “Ele respondeu: Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus”(Mt 4,4). Com seu jejum Jesus se prepara a cumprir a missão de obediência ao Pai a serviço de amor aos homens e mulheres do seu tempo.
Ele simplesmente está praticando o jejum que seus irmãos judeus praticavam em Israel e na diáspora. Jejum, oração e esmola são um ato de amor ao Pai “que no vê no segredo” (Mt 6,18). São aspectos essências do seguimento de Jesus por parte dos discípulos. Quanto lhe perguntam por qual motivo os seus discípulos não praticam as formas de jejum que estão em uso em no judaísmo do seu tempo, Jesus responde:“Podem, porventura, jejuar os convidados para o casamento, enquanto o noivo está com eles?”(Mc 2,19). E acrescenta: “Dias virão, contudo, em que lhes será tirado o noivo; e, nesse tempo, jejuarão”(Mc 2,20). Nestas palavras os cristãos encontram o fundamento do convite ao jejum como sinal da participação dos discípulos ao acontecimento doloroso da paixão e da morte e da ressurreição de Jesus.
A referência a Cristo e sua morte e ressurreição é essencial e crucial para definir o sentido cristão do jejum e da abstinência: "Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, tome a sua cruz e me siga "(Mc 8,34). Na verdade, é no seguimento de Cristo e de acordo com sua gloriosa cruz que os cristãos encontram a sua identidade.
A pratica penitencial no Antigo Testamento
A pratica do jejum, como a da esmola e da oração, não é uma novidade trazida por Jesus: refere-se à experiência religiosa do seu povo, Israel, onde o jejum é praticado como um momento de professar a fé no Deus Único e verdadeiro, fonte de todo o bem, e como elemento necessário para superar as provas nas quais são submetidas a fé e a confiança no SENHOR.
Moisés e Elias se abstiveram de comer para prepararem-se ao encontro com Deus (Cf. Es 34,28; 1 Re 19,8). Vejamos o que aconteceu no tempo de Samuel: “Congregaram-se em Mispa, tiraram água e a derramaram perante o Senhor; jejuaram aquele dia e ali disseram: Pecamos contra o Senhor”. (Cf. 1Sam 7.6). A consciência do pecado, da dor, do arrependimento, da conversão podem manifestar-se de diferentes modos. Num momento de crise o povo pede perdão e se arrepende voltando a adorar o Deus único. O profeta Joel relembra estes momento, quando diz: “Ainda assim, agora mesmo, diz o Senhor: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração; e isso com jejuns, com choro e com pranto. Rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao SENHOR, vosso Deus, porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e se arrepende do mal. Quem sabe se não se voltará, e se arrependerá, e deixará após si uma bênção, uma oferta de manjares e libação para o Senhor , vosso Deus? Tocai a trombeta em Sião, promulgai um santo jejum, proclamai uma assembleia solene. Congregai o povo, santificai a congregação, ajuntai os anciãos, reuni os filhinhos e os que mamam; saia o noivo da sua câmara, e a noiva, do seu aposento. Chorem os sacerdotes, ministros do Senhor, entre o pórtico e o altar, e orem: Poupa o teu povo, ó Senhor, e não entregues a tua herança ao opróbrio, para que as nações façam escárnio dele. Por que hão de dizer entre os povos: Onde está o seu Deus? Então, o SENHOR se mostrou zeloso da sua terra, compadeceu-se do seu povo”(JI 2,12-18). Para tornar a oração mais intensa, o povo de Israel prostra-se e renuncia a alimentar-se (Cf. Ne 1,4; 2Cr 20,3; 2Mc 13,12; Dn 9,3). Privando-se de alimentos, algumas mulheres da historia do povo de Israel reconheceram os limites da sua própria força e apelaram à força de Deus, reconhecendo que só Ele pode salvar (cf Jt 8,6; Est 4,3.16).
E, no entanto, mesmo na prática do jejum, como em qualquer expressão de religiosidade, pode se esconder muitos perigos: Pensamos que podemos reivindicar certos direitos diante de Deus. Por este motivo, o profeta denuncia a falsidade do formalismo e prega o verdadeiro jejum que Deus quer: “Porventura, não é este o jejum que escolhi: que soltes as ligaduras da impiedade, desfaças as ataduras da servidão, deixes livres os oprimidos e despedaces todo jugo? Porventura, não é também que repartas o teu pão com o faminto, e recolhas em casa os pobres desabrigados, e, se vires o nu, o cubras, e não te escondas do teu semelhante?”(Is 58, 6-7).
Há, portanto, uma ligação íntima entre o jejum e a conversão de vida, o arrependimento dos pecados, a oração humilde e confiante, o exercício da caridade fraterna e da luta contra a injustiça, "Boa coisa é a oração com jejum e esmola com a justiça" (Tb 12,8)
Também existem outras formas de jejum quando privamo-nos de alguma coisa que mais gostamos. O mais importante é aprender a colocar a confiança só em Deus.